Maria Felipa: A Heroína Negra que Incendiou a Independência da Bahia
- Família viajante
- 27 de jun.
- 3 min de leitura

Quando se fala em independência do Brasil, é fácil lembrar dos nomes estampados nos livros didáticos — quase sempre brancos, homens, membros da elite. No entanto, em meio ao calor das batalhas que selaram o 2 de Julho, a verdadeira Independência da Bahia, surge a figura luminosa e destemida de Maria Felipa de Oliveira: uma mulher negra, livre, pescadora, líder popular, estrategista, símbolo do poder feminino e do protagonismo do povo.
Quem foi Maria Felipa?
Maria Felipa nasceu na Ilha de Itaparica, no Recôncavo Baiano, provavelmente no fim do século XVIII. Negra, livre, forte e conhecedora do mar, era respeitada em sua comunidade por sua coragem, liderança e dedicação à coletividade. Era pescadora, marisqueira, trabalhadora manual — filha do Recôncavo mestiço, baiano e insurgente.
O Protagonismo na Luta do 2 de Julho
Durante a guerra da Independência da Bahia, entre 1822 e 1823, Maria Felipa se destacou como líder de um batalhão de mulheres que enfrentou, com armas improvisadas, as tropas portuguesas que tentavam manter o controle da ilha estratégica de Itaparica.
As Táticas de Maria Felipa
Emboscadas e incêndios: Maria Felipa organizava ataques noturnos e emboscadas junto com cerca de 40 mulheres, armadas com galhos de cansanção (planta urticante), pedaços de pau, pedras e muita astúcia.
Sabotagem: Sob seu comando, o grupo invadiu acampamentos portugueses, ateou fogo em pelo menos 42 embarcações inimigas, provocando baixas e confusão entre as tropas coloniais.
Humilhação simbólica: Relatos históricos contam que, após render soldados portugueses, Maria Felipa e suas companheiras os teriam açoitado com galhos de cansanção, causando dor e constrangimento aos invasores.
Rede de apoio: Além do confronto direto, ela articulava toda uma rede de apoio logístico e emocional aos combatentes brasileiros, ajudando feridos, alimentando guerreiros, protegendo mulheres e crianças, e servindo como exemplo de liderança.

Uma História que Resistiu ao Silêncio
Apesar da importância, Maria Felipa foi durante muito tempo silenciada pela história oficial — em parte pelo preconceito racial e de gênero, em parte porque sua atuação escapava ao padrão das heroínas “convencionais”. Sua memória sobreviveu pela tradição oral, nas rodas de samba, nos terreiros, nos cantos das marisqueiras e nos relatos da ilha.
Foi só nas últimas décadas, graças ao trabalho de pesquisadores, historiadores e movimentos negros e feministas, que Maria Felipa passou a ganhar o reconhecimento que merece. Hoje, é celebrada como Heroína da Pátria (Lei nº 13.697/2018), nome de escolas, praças e movimentos sociais, e inspiração para a luta de mulheres e negros por igualdade e dignidade.
Maria Felipa e o 2 de Julho
Sem a ação decisiva de Maria Felipa e seu batalhão de mulheres, a Ilha de Itaparica poderia ter sido retomada pelas forças portuguesas, alterando o rumo da guerra e, talvez, da própria independência nacional. Sua resistência garantiu uma importante base de apoio para os baianos e mostrou que a liberdade não é concessão — é conquista do povo.
Símbolo Vivo da Bahia e do Brasil
Hoje, a imagem de Maria Felipa representa:
A luta contra o racismo estrutural e o machismo.
A força das mulheres e das comunidades negras na construção do Brasil.
O poder da resistência popular, da união e da coragem coletiva.
O valor da memória — pois a história que não se conta é a história que se perde.
Legado e Homenagens
A cada 2 de Julho, em Itaparica, Salvador e várias cidades do Recôncavo, o nome de Maria Felipa é celebrado com orgulho. Sua trajetória inspira novas gerações a jamais se calarem diante da injustiça e da opressão.
Mais que uma personagem do passado, Maria Felipa é um exemplo atual de liderança, resistência e esperança — a heroína negra que incendiou a história e ajudou a libertar não só a Bahia, mas todo o Brasil.
Matéria baseada em relatos históricos, pesquisas acadêmicas e entrevistas com especialistas em cultura afro-baiana e história da independência.
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